quarta-feira, 19 de setembro de 2012

João Pinto [Projeto EZ] em entrevista à Bússola

A conversa com o João Pinto, mentor do Projeto EZ e interveniente em múltiplos acontecimentos artísticos ao longo da última década, foi uma caixinha de surpresas, ou talvez não. Havia um alinhamento, mas mais do que isso, fizemos uma conversa informal… por vezes, uma mera troca de opiniões e perspetivas. 


A genuinidade e espontaneidade vivem em cada uma das frases de um jovem que há muito mostrou o que vale e é verdadeiramente um exemplo de dedicação, persistência e capacidade de ultrapassar as limitações para qualquer um de nós. 

Nada melhor do que começar pelo início e perceber as origens e motivações de um percurso tão vasto como o que João Pinto transporta no seu currículo. 
João diz-nos que «tudo começou no Chapitô». «Foi uma escola, mas acima de tudo um carimbo. Por lá aprendi imenso e abriram-se portas, mas a maior formação é a experiência. É na rua, a resolver problemas e situações concretas, que se aprende». 
Mas, «na prática, nasci no Art’Encena, onde fui literalmente lançado aos leões. Foi com eles que fui para a rua experimentar e enfrentar as dificuldades. Foi assim que cresci. No percurso, cruzei-me com Istaminé, que entretanto se separaram, mas pontualmente poderão voltar a cruzar-se. E hoje dedico-me ao projeto EZ». 

Porquê a opção animação em detrimento do espetáculo mais rigoroso? 
«É uma opção apenas. Está dentro de mim… 
Eu nasci para isto com a personagem do bobo, NO Art’Encena. Esta personagem vive inteiramente da comunicação com o público e, ainda hoje, muitos anos depois, me falam dele. Eu estava a sentir e a viver aquilo intensamente, literalmente a improvisar. Era como se fosse real. Consegui estar 2 ou 3 horas na rua, com o público, e pareciam apenas 15 minutos. 
Os projetos desta natureza vivem da força, da essência, da vontade…» 

Poderemos acrescentar que vivem da PAIXÃO! 


“Já faço feiras medievais há 12 anos… começo a precisar de fazer coisas diferentes…” 


A experiência como narrador da Viagem Medieval, em 2010, foi diferente? 
«Foi diferente em tudo, mesmo na formação. Até então nunca tive alguém a mandar em mim, um encenador. Sempre tinha trabalhado em função da liberdade da rua e do público, aqui encontrei um novo desafio, com mais rigor técnico. Foi uma boa experiência, adorei, mas este conceito não me agrada muito». 


“O teatro de rua vive do público… só está quem quer e ninguém tem de pagar bilhete” 
“É essa a essência, a liberdade a espontaneidade…” 


E em relação ao Projeto EZ, encaixa nesse alinhamento mais aberto? 
«Sim, fiz aquilo que gosto, com ligeiros ajustamentos. Fiz inteiramente para mim, porque eu tenho de ser o meu maior crítico». 

Como nasceu o Projeto EZ? 
«Bem, EZ nasceu em 2006, quando saí do Chapitô. Nasceu do sonho… da minha educação em casa: quando tu queres uma coisa tens que trabalhar para ela. 
A minha noção era ter a minha mala às costas e vender o meu produto da forma mais simples. Tudo isto nasceu da construção de um espetáculo que nunca levei para a frente, o “1 palmo de estupidez”… e o projeto vivia disso, seguir-se-ia o 2 palmos de estupidez e por ai adiante. Mas passou, passou, passou… 
Acabei por começar com trabalho que não queria tanto… e agora renasceu tudo. É uma daquelas coisas em que podemos dizer que nos sentimos realizados. Tem um caráter muito meu, uma enorme conotação pessoal. 
Enfim, tudo nasceu do projeto das bicicletas (leia-se veículos), mas não se resume APENAS a isso. Bem, na prática, tudo começou no Facebook. Deixei uma imagem do primeiro protótipo e a reação foi absolutamente positiva. E a partir daí fui por aí adiante». 


“Não sou feliz se não estiver a inventar” 


Porquê o nome EZ? 
«EZ é o início e o fim de “EstupideZ”. Quando estamos a criar algo, a dado momento consideramos sempre que algumas das nossas ideias são estúpidas e vão para o lixo. Mas aí está o erro. Estupidez é não concretizarmos as nossas ideias, é não sermos felizes.» 

Como surgiu o Imaginarius 2012? 
«O EZ que conhecemos nasceu no Imaginarius. Chamaram-me e disseram-me: nós vamos ter de fazer algo para a promoção do festival, queres ser tu a fazer isso? Aceitei o desafio, mas, na prática, o que temos não é nada do que foi pensado. 
Tinha a ideia de usar os veículos numa espécie de pista de obstáculos, mas acabamos por fazer algo mais deambulante e com menos logística. E temos um problema: eu não sou engenheiro. Não poderíamos deixar os veículos ao uso exclusivo do público, daí a mudança. Tivemos a perspetiva de aumentar a interação e a segurança». 

E o público, como o sentes? 
«Não tenho muito a noção da adesão do público. Acabo por não ter a consciência das potencialidades. Só pelo que me dizem…» 

E como nasce O TRABUCO, o inovador projecto para a Viagem Medieval 2012? 
[sorrisos] 
«Foi criado em reunião. Cerca de 3 semanas antes da Viagem Medieval, convidaram-me para uma reunião, com a sugestão de uma proposta para a programação da Viagem. 
A minha ideia para um projeto a este nível seria a criação de uma perspetiva original de algo a solo (tipo Tosta Mista), queria parar para fazer este espetáculo, mas com 3 semanas apenas isso seria quase impossível. Fomos explorando uma ideia solta que estava na minha cabeça e à medida que fui explicando o conceito foi nascendo o que vimos. 
Com isto, tive apenas 3 semanas de intenso trabalho, uma delas à espera do carro de golfe. Mas lá fui preparando tudo e avançando com os figurinos. Foram duas semanas de construção… aquilo que eu realmente gosto!» 

Como partiram para a Viagem? 
 «Começamos por descer a rua da Câmara e lá foi uma faixa das que ambientavam o recinto… fomos logo destruir. 
Sempre consideramos que não era um espetáculo, estávamos num outro alinhamento. Em cada saída, a ideia era vamo-nos divertir! E aos poucos começamos a ver as potencialidades da máquina. 
O nosso objetivo era fazer algo que fosse capaz de fazer encher o olho e de arrancar as máquinas fotográficas dos bolsos do público. 
Não fizemos ensaios, apenas testes de capacidade e segurança. Tudo aconteceu espontaneamente». 

Gostaste do resultado? 
«Gostei deste trabalho, gosto de fazer trabalhos por encomenda. Gosto realmente deste tipo de trabalho, mas, nunca pensei que me cansasse tanto». 

Futuro da engenhoca? 
«Não tenciono vender o Trabuco, até porque o conceito foi criado especificamente para Feira, vive do espaço e das características daqui e não conheço mais feiras com este espaço». 

Saldo da Viagem… 
«Eu senti-me muito bem. 
Por vários motivos: construção da ideia; todas as pequenas coisas em relação à organização; fui bem tratado a todos os níveis… A satisfação e reação do público… Por tudo isto faço um balanço muito positivo». 

Novas máquinas/engenhocas? 
«Existem, eu não quero parar! 
Quero dinamizar o material dos vários projetos, sejam os veículos ou a estrutura para o medieval. Há novas ideias e coisas fantásticas que eu quero construir. Gostava de abordar veículos que marquem a diferença e sejam mais ilusão. Quero construir com mais utilidade para o dia-a-dia e moldar os veículos de forma a poderem ser usados por qualquer pessoa. Gostava de me aventurar noutros veículos. 
Eu considero sempre duas etapas, bem distintas, nos projetos EZ: a construção e o espetáculo. Quero sempre construir ideias impossíveis. Para isso, o meu armazém é só meu… Ali, criam-se coisas fantásticas. Lá tudo é possível, se houver tempo e capacidade para criar». 


“Sou capaz de criar à minha maneira” 

“Eu vivo um dia de cada vez” 
 “Não sou rico mas sou feliz” 


João Pinto mostra-nos uma verdadeira lição de vida e uma intensa e saudável persistência em busca da concretização dos sonhos e dos projetos. Promete novidades para breve: anuncia-se uma nova imagem para o projeto EZ, aliada a uma página web e novas ferramentas de comunicação. E como é óbvio, vemo-nos por aí… Na rua! Para que não escape nada, todas as novidades do projeto EZ estão em atualização permanente na sua página Facebook (www.facebook.com/ezveiculos). Antes de terminar, há coisas que não devem ficar esquecidas. João Pinto deixa um agradecimento especial às lojas “A Novidade” e “Girafa Kids” pela cedência de espaço e apoio incondicional. 


Texto: Bruno Costa
Coordenação Geral: Bruno Costa e Daniel Vilar

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